Monday, 10 July 2017

A recuperação

Faz 7 semanas que fui operada de apendicite. Como eu nunca havia feito cirurgia antes, não sabia o que era normal e o que não era, então passei por muitos momentos difíceis, sem saber o que fazer. Ainda mais estando sozinha em Londres, um lugar que pode ser muito difícil de se conseguir ajudar médica. O que facilitou era que o hospital era 5 minutos de caminhada da minha casa, então das vezes que tive que ir lá eu não dependia de ninguém.
Na maioria dos países, quando se faz cirurgia assim o normal é ver o cirurgião 2 semanas após a cirurgia pra ver como está tudo e tirar dúvidas. Pois não vi cirurgião nenhum desde a cirurgia e dependi da boa vontade e generosidade de conhecidos médicos no Brasil responderem minhas dúvidas por whatsapp. Da próxima vez que eu for ao Brasil pagarei consulta particular com eles, como agradecimento.
Pelo fato de eu ter me mudado pro outro lado da cidade, não havia a menor possibilidade de ver o médico que eu sempre ia, então tive que me registrar numa outra clínica no bairro para onde eu havia me mudado. Esse processo levou uns dias (o que é normal), e além disso é difícil conseguir consulta médica logo a não ser que seja uma emergência. Só que no meu caso eu não sabia o que era pra ser preocupante ou não. Comprei um termômetro pra ver se tinha febre, o que não foi o caso (ainda bem, pois isso significaria uma inflamação), mas tirando isso o meu guia era um médico conhecido para quem eu enviava fotos dos cortes pra ele ver se estavam melhorando ou não, e ele que me ensinou a cuidar deles.
Fiz uma montagem das fotos que eu ia batendo dos cortes todos os dias pra acompanhar o progresso, e o do umbigo e o mais abaixo estavam progredindo bem, entretanto o corte do lado esquerdo foi deixado aberto. Segundo o médico conhecido, ele disse que isso chama-se fechar por segunda intenção, e por isso demoraria mais pra fechar. Me aconselhou a limpar os cortes com soro fisiológico (saline solution em inglês) e cobrir com curativo novo. O que ficou aberto não poderia ser molhado até fechar.
Esse corte me incomodou bastante, ainda mais quando um dos pontos começou a sair de dentro dele. Fui instruída a procurar um médico em Londres pra avaliar, mas quem diz que consigo consulta... Acabou que num período de 3 semanas sentei na unidade de urgência do hospital (não era a emergência, que é pra quem está com a vida em risco, mas um lugar pra quem tem problemas não urgentes, mas que demandam atenção logo) várias vezes por muitas horas, pra ver uma enfermeira ou médico. Aqui na Inglaterra as enfermeiras têm um papel de assumir bem mais responsabilidades que no Brasil. Médico só quando é mais grave mesmo.
A espera naquele hospital às vezes chegava a 4 horas. Vi pessoas com dor ter que esperar sentada daquele jeito. Ainda bem que eu não tinha dor, mas uma noite tive que esperar 2.5 horas pra ver uma enfermeira.
O atual governo da Inglaterra está realmente destruindo o sistema de saúde público de lá. É bem claro que querem privatizar tudo. Não sei que tipo de idiota quer seguir o modelo de saúde dos estados unidos... Eu não me considero uma pessoa de esquerda, mas saúde pública, pra mim, é essencial (não vou entrar no mérito de que tipo de coisas tem que ser cobertas pela saúde pública ou não).
De qualquer forma, uma primeira enfermeira que eu vi na primeira vez que eu fui tentar ser atendida me deu um mel medicinal pra passar no corte que ficou aberto, e fui fazendo isso ao longo dos dias. Ela disse pra eu ver uma enfermeira toda semana pra monitorar o progresso de fechamento. O problema é que na clínica que eu me registrei só tinha enfermeira duas vezes na semana, o que é ridículo! Além do mais, a clínica ficava 20 minutos de caminhada da casa da Jinny (era a mais perto que tinha), o que não era nada agradável pra quem mal podia caminhar. Lembro de um dia quando o tempo estava absolutamente infernal, a maior chuva e vento, trânsito parado (por isso nem arrisquei a pegar táxi), e eu caminhei até a maldita clínica pra ver uma enfermeira. Uma vez lá, não fui atendida, então tive que caminhar naquele tempo horrível até o hospital. Foi um dia absolutamente hossível e frustrante.
Na montagem das fotos dá pra ver que uma casquinha preta começou a se formar no corte que foi deixado aberto, o que era sinal de que a cicatrização estava progredindo bem, mas depois a casquinha saiu. Isso foi porque em ninguém havia me mostrado como tirar o curativo na hora de trocar de forma que não puxasse a ferida junto, e era isso que estava acontecendo. Com isso o processo demorou mais ainda! Só 5 semanas depois da cirurgia que eu descobri como fazer isso, após ter comprado curativos especiais (e caros) na internet pra conseguir tomar banho direito sem molhar. Estes curativos tinham uma redezinha que ficava em cima da ferida, e ao tirar o curativo eu podia segurar essa redezinha no lugar. Aì molhava essa redezinha e ela se soltava da ferida. Então eu limpava levemente com soro e gaze limpa e cobria com outro curativo.
3 semanas após a cirurgia era pra eu ter ido pros Estados Unidos no casamento de um amigo, e depois visitar o André em Boston, pois ele está trabalhando lá. Encontrei na internet o contato do ciurgião que fez o meu discharge do hospital e mandei email perguntando se poderia viajar, pois segundo a empresa aérea 10 dias seriam suficientes após esta cirurgia. Ele me respondeu dizendo que não era pra eu ir numa viagem tão comprida tão cedo (11 horas de avião), pois poderia ter problemas com trombose (aumentam as chances depois de uma cirurgia) ou dor no abdomen por causa do gás usado pra inflar o abdomen na cirurgia. Fiquei muito triste e chateada, ainda mais porque a empresa aéra se recusou a me reembolsar um centavo, então acabei perdendo quase 600 libras, mesmo eu tendo enviado a carta do médico e do hospital explicando que foi uma emergência. Nunca mais compro passagem com a Virgin Atlantic. Falta de humanidade, na minha opinião.
Só consegui um médico na clínica onde me registrei 1 mês depois da cirurgia (clínico geral) e fui lá com um monte de perguntas, falando das dores que eu sentia, mostrei os cortes, e ele falou que estava tudo normal e que era pra esperar. Disse que as dores iriam diminuir com o tempo.
Cerca de 1 semana depois notei que havia um ponto que estava por fora do corte do umbigo, que não havia sido absorvido. Fui no hospital de manhã bem cedo, esperei 2 horas e nada de ser atentida. Haviam pessoas lá esperando desde meia-noite pra serem atendidas. Naquele dia desisti e resolvi marcar uma consulta particular com um médico no centro (no bairro onde eu moro não tinha médico particular) pra ele tirar esse ponto, já que as clínicas não abrem no fim de semana. Consulta de 130 libras, ele viu e disse que não iria encostar, pois tinha medo que abrisse algo por dentro. Completamente inútil! Pelo menos não cobrou a consulta.
Acabei indo no NHS walk-in centre que ficava 30 min da casa da Jinny pra ver uma enfermeira. Ela tirou aquele ponto, que já estava me incomodando pois doía.
Depois disso o processo de cicatrização foi mais evidente, e agora até aquele que havia sido deixado aberto está praticamente fechado.
Entretanto ainda sinto dores às vezes, mas de bem menor intensidade e menos frequente. Ao redor da ferida que ficou aberta os músculos estão todos duros e dóem vez ou outra. Sinto que agora já posso fazer a maioria das coisas que fazia antes da cirurgia sem precisar me mexer que nem lesma.
Ainda não posso voltar pra academia, me disseram pra esperar 8 semanas, por isso por enquanto tenho feito caminhadas, mas sem forçar, pois senão esse do lado esquerdo ainda dói. Mal posso esperar pra estar 100% recuperada.
De repente este post é útil pra alguém que também tenha sido operado e queira ver sobre a experiência de outras pessoas.

Corte inferior

Corte abaixo do umbigo (fotos de cabeça para baixo)

Corte onde não foi dado ponto, o tal de segunda intenção